Dia desses, estava comentando com um amigo o quão “pesado” está assistir aos noticiários, em que pipocam notícias ruins, principalmente no que tange às crises política, econômica e ética que assolam o país. E esse clima pesado tem feito com que sentimentos tais como desolação e revolta transformem-se em uma epidemia – esse fato é facilmente comprovado ao notarmos o tom agudo das conversas entre indivíduos nas ruas ou a forma agressiva/insana de postagens relacionadas ao tema nas principais redes sociais.
Se por um lado a não apatia diante da crise pode ser vista como uma virtude, é preciso tomar muito cuidado para que assuntos políticos, econômicos e éticos não assumam um caráter estritamente emocional. Não é possível travar um debate sério e transformador, com ânimos exaltados, pois os resultados tendem a ser desastrosos.
Nesse clima de embate, já ouvi quem falasse na preparação de milícias de haitianos para um possível golpe, que seria melhor a volta da ditadura, que o negócio é quebrar tudo e matar os políticos, além da volta do boato sobre a possibilidade de confiscarem nossa Poupança. Se tais devaneios fossem fatos isolados, poder-se-ia até relevar, mas o sentimento negativo exacerbado e generalizado tem cegado até mesmo mentes bastante esclarecidas, a ponto de se acreditar no ilógico. Isso vale tanto para quem defende o governo atual, como para seus críticos.
Mas apesar do momento turbulento, é preciso colocar um pouco de racionalidade no sistema. Temos que refletir e nos conscientizar sobre o papel que devemos exercer, para que saiamos fortalecidos dessa crise, ao invés de destroçados. Não adianta apenas esbravejar, torcer contra, nem mesmo defender o que já está claro como incompetente e amoral. É preciso que venhamos a assumir uma postura proativa, de forma a utilizarmos nossa preciosa energia para a construção de algo melhor no futuro.
Buscando defender esse ponto de vista menos emocional e mais racional, ofereço 4 dicas importantes para que você possa lidar com a atual crise, de maneira mais sábia e efetiva, focando principalmente – mas não exclusivamente – nas finanças pessoais. Confira e depois deixe seu comentário ao final dessa página.
1) Momentos de crise são ideais para mudança de paradigmas.
Amparando-se na história, são inúmeros os casos relatados em que crises permitiram grandes mudanças – para o bem ou para o mal. Hitler aproveitou o orgulho aviltado do povo alemão após a primeira guerra para que todos se unissem em busca de seus escusos objetivos. A literatura apresenta casos empresariais interessantes em que, mergulhados em uma crise, líderes aproveitaram o ensejo para alterar a cultura organizacional nociva (que antes parecia impossível) e conseguiram dar a volta por cima. E não posso, por fim, deixar de citar pessoas incríveis que superaram doenças ou situações de grande sofrimento, e fizeram desse calvário o ponto de partida para se tornarem seres humanos grandiosos.
Isso ocorre porque as crises oferecem um campo fértil para reflexão profunda e o afloramento da criatividade. Em momentos difíceis, se o processo for conduzido por uma liderança confiável, os indivíduos ficam mais propensos a concessões e mudanças. Em suma, se vista como oportunidade, uma crise tem o poder de se tornar um catalisador para transformações de hábitos individuais e coletivos.
Nesse contexto, essa primeira dica significa dizer: não deixe as notícias ruins lhe causar sentimentos autodestrutivos. Da mesma forma que se aprende em artes marciais como o jiu-jitsu, use essa imensa força negativa a seu favor. Tenha a consciência e sabedoria de fazer desse momento de crise um ambiente favorável a grandes mudanças de paradigmas, sejam eles financeiros ou não.
2) Mude hábitos financeiros.
Seja no âmbito pessoal ou familiar, aproveite o receio de perder o emprego ou de diminuição das receitas (para empreendedores e autônomos), para adquirir bons hábitos financeiros e eliminar aqueles que forem ruins.
Caso nunca tenha feito uma planilha de orçamento doméstico, que tal iniciar a partir de agora um controle mais rígido das finanças? Aproveite os altos preços da energia elétrica, água e combustível para adquirir hábitos que permitam economizar dinheiro e proteger a natureza. Pense em formas de lazer menos dispendiosas e que valorize mais o intelecto e/ou a interação com as pessoas que você gosta. Crie a rotina de guardar dinheiro todo mês, de forma que futuras crises possam ser superadas de maneira mais amena.
Enfim, essa segunda dica resume-se a utilizar da crise para se tornar uma pessoa mais centrada e focada no que é importante. Adquirindo hábitos que deem conta do que é PRIORIDADE. E o melhor: tornando-se alguém mais eficaz, você também agirá com distinta sabedoria quando momentos de bonança surgirem novamente.
3) Eduque, financeiramente, seus filhos.
Devido à massiva repercussão na imprensa sobre crise econômica e desvio do dinheiro público, é óbvio que crianças e jovens acabam percebendo que algo não está bem. Acredito que muitas delas se interessem em saber o que realmente está acontecendo, criando a abertura necessária para que você explique a elas a dimensão do problema e como isso pode afetar o futuro de toda a família.
Explique que o governo gastou mais do que devia, que agora o preço do sorvete não para de subir (inflação), que muita gente tem perdido o trabalho, que comprar brinquedos de forma parcelada ficou mais caro, e que se não tomarem cuidado – economizarem – a qualidade de vida da família poderá diminuir bastante.
Espero que tenha clareza de que não é o objetivo desse artigo dissertar sobre os melhores métodos pedagógicos de se aplicar no ensino de tais informações. Mas conhecendo seus filhos e suas peculiaridades, tenho certeza que saberá passar de maneira simples e lúdica os principais problemas que estamos passando e sobre a necessidade de adequar comportamentos em situações difíceis.
E antes que termine essa terceira dica, não posso me esquecer de algo tão importante (ou mais) quanto as lições de economia. Aproveite a atual crise ética para reforçar a importância de princípios e valores como honestidade, integridade e amor ao próximo, algo tão em falta não só no âmbito político, mas também na sociedade em geral.
4) Aprenda a posicionar-se.
Quer um momento mais interessante do que esse para se interessar e aprender sobre economia? Ter uma boa noção sobre como a Selic, a inflação, o câmbio e outras variáveis macroeconômicas influenciam suas finanças pessoais? A incorporação de tais conhecimentos pode fazer toda a diferença em suas finanças, no longo prazo.
Você sabia que os detentores de fortunas, nesse momento de crise, estão se posicionando ao invés de somente gastar energia reclamando? Vou explicar com dois exemplos o que significa esse termo “posicionar”, tão utilizado pelo mercado.
Exemplo 1: muitos projetos imobiliários, para ter seu início, precisam de investidores que injetem capital em busca de bons lucros. Mas há alguns meses, os tais investidores sumiram. Ao notar que o preço dos imóveis estava chegando no limite e uma crise se aproximando, refizeram suas posições. Alocaram dinheiro para investimentos menos arriscados e/ou mais rentáveis, e voltarão a investir em imóveis apenas quando ventos melhores soprarem.
Exemplo 2: com a desconfiança na economia brasileira, diminuição do grau de investimento em diversas áreas, além da crise política, muito capital estrangeiro tem deixado o país, em busca de alternativas mais seguras. Eles trocam, por exemplo, investimentos no país por títulos do governo americano, que pagam menos juros, mas são mais seguros. Posicionam-se de maneira defensiva na crise para, a qualquer sinal de recuperação, voltarem a investir no Brasil.
Deu para perceber que o capital dos investidores fica alheio à emoção? É por isso que passada uma crise, geralmente quem era rico fica ainda mais, e a parcela da população que não se preparou para a retomada do crescimento e se estrepou na recessão, fica a ver navios.
Portanto, a dica quatro diz que é preciso que você utilize desse momento para se posicionar. Diminuindo as despesas, guardando dinheiro para uma emergência ou oportunidade, verificando seu grau de exposição a risco (qual seu nível de estabilidade no emprego? Se for empresário ou autônomo, quais as perspectivas para o seu ramo de atividade, em meio à crise?).
Aproveite para fazer o que os outros não estão fazendo. Enxergar aquilo que os cegos de ódio não podem ver. Nesse momento é mais prudente ser formiguinha, e trabalhar duro para enfrentar o que vem por aí, do que ser cigarra e ficar cantarolando (nem que sejam cantigas de guerra).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para concluir, quero deixar bem claro o objetivo desse artigo. Ele não apregoa, de maneira alguma, que você se omita enquanto cidadão e aceite o que julga ser errado. Muito menos tem o intuito de criticar ideologias ou fazer qualquer defesa ou ataque partidário. O objetivo foi trazer à tona alguns pensamentos mais próximos à racionalidade, dado o turbilhão de emoções que se tornou o cenário político/econômico brasileiro.
Busquei, tão somente, oferecer dicas para que as pessoas pudessem utilizar de maneira mais eficaz suas energias (recurso esse tão precioso hoje em dia). Que pudessem fazer da crise um momento de crescimento e fortalecimento pessoal, familiar e social. E que os erros que nos trouxeram até aqui sirvam de lição para não mais descuidarmos de nossas finanças, de nosso país.
A mesa está posta. Agora basta decidir se o atual momento de crise será um ponto de partida para algo melhor, ou não.