Sobre trocar ou não de carro
Um leitor do blog Dinheirama.com se deparou com meus dois artigos que tratam sobre como calcular o custo médio mensal de um carro PARTE 1 e PARTE 2, enviando-me o seguinte questionamento (adaptado do texto original):
“Utilizei de suas planilhas e verifiquei que, em média, 50% do meu salário líquido mensal é gasto com meu veículo. Quero diminuir esse gasto para 40% do meu salário, no máximo. Então estou estudando trocar de carro para diminuir os valores da prestação e manutenção. A ideia é entrar num consórcio e dar um lance (o veículo tem 15% de desconto para quem trabalha na concessionária XXXXX e eu trabalho lá).
A questão é: vale a pena fazer um empréstimo consignado para dar o lance? Como fazer esse cálculo para saber se vale ou não a pena? Meu veículo é usado e financiado pelo modelo CDC. Se devolvê-lo hoje certamente não receberei nenhum dinheiro de volta. Sinceramente hoje vejo que fiz um péssimo negócio, o primeiro carro é sempre tentador…”
Ao receber esse depoimento, entrei em contato com o leitor para pedir mais informações, de forma a ser possível dar uma opinião mais embasada. Veja nas tabelas abaixo os números referentes à situação atual e a proposta pelo nosso amigo.
OBS: o leitor me enviou um aviso importante de que não pode ficar sem carro, pois precisa para trabalhar. Portanto, não há a opção de se desfazer do carro.
SITUAÇÃO DO CARRO ATUAL
ITENS ANALISADOS |
INFORMAÇÕES |
Valor de mercado do carro atual |
R$20.000,00 |
Saldo devedor do financiamento CDC |
R$20.546,24 |
Número de parcelas a serem pagas |
44 |
Valor das parcelas mensais |
R$694,73 |
Custo médio mensal do carro |
R$1.200,00 |
Comentários: atualmente o valor que conseguiria pela venda do carro é menor que o saldo devedor; o custo médio mensal do carro é alto, por incluir o valor das parcelas.
SITUAÇÃO PROPOSTA
ITENS ANALISADOS |
INFORMAÇÕES |
Valor de mercado do carro zero |
R$33.950,00 |
Valor a ser pago pelo carro |
R$32.320,40 |
Empréstimo consignado para dar o lance |
R$8.657,25 |
Número de parcelas do empréstimo consignado |
36 |
Valor das parcelas do empréstimo consignado |
R$350,00 |
Saldo devedor após o pagamento do lance |
R$23.663,15 |
Número de parcelas do financiamento (após lance) |
80 |
Valor das parcelas do financiamento |
R$295,79 |
Custo médio mensal do carro (esperado) |
R$1.000,00 |
Comentários: mesmo com 15% de desconto sobre o valor de mercado do carro, devido a trabalhar na concessionária, o valor financiado não diminuiu muito por haver uma taxa administrativa de R$3.462,90; havia apenas uma dívida e agora serão duas.
COMPARAÇÃO ENTRE OS DOIS CENÁRIOS
– a intenção inicial do leitor era diminuir a parcela de seu salário destinada ao carro. Através dos dados fornecidos, o custo médio mensal diminuiu em R$200,00, pois o valor das parcelas diminuiu e os gastos de manutenção esperados também.
– com relação ao item acima, a diminuição do valor pago a título de financiamentos diminuiu ligeiramente pelo simples fato de a dívida ser mais longa. Na situação atual a dívida seria quitada em 44 meses, passando para 36 (consignado) e 80 (financiamento) meses, na proposta. Matemática financeira é assim, aumenta o prazo de pagamento, diminui o valor das parcelas. Em algumas situações de insolvência no curto prazo isso é desejável, mas não creio ser o caso aqui.
– possuir um carro que minimize os gastos com combustível e manutenção é uma estratégia desejável. Se o carro atual está dando muitos problemas, além da dor de cabeça que isso causa, uma troca por algo mais econômico é interessante. Todavia, vale lembrar que o valor de seguro/IPVA, nesse caso, será maior no carro zero.
– o cenário proposto fez o saldo devedor sair de R$20.546,24 para R$32.320,40 (financiamento + crédito consignado). Ou seja, mesmo diminuindo um pouco o valor mensal gasto com o carro, a dívida aumentou em quase R$12 mil. Um dinheiro e tanto…
– um carro zero possui uma depreciação inicial muito maior que um carro usado. Isto é, nos primeiros meses de uso, seu valor cai consideravelmente. Isso é uma perda de patrimônio a ser levada em conta.
– Não podemos nunca deixar de considerar um fator que é o PRAZER de ter um carro zero…
O QUE FAZER ENTÃO?
Quando a pessoa se encontra em uma situação de dívidas com carro, é sempre uma “corrida atrás do rabo”:
1) Financia um veículo;
2) O carro perde valor no tempo;
3) Toda vez que trocar de carro sairá perdendo;
4) E inicia-se um novo financiamento.
Em minha modesta opinião, o ideal seria traçar uma estratégia a fim de sair desse ciclo o quanto antes, pois os juros são altos (sim, uma taxa de 2% ao mês é altíssima – artigo de novembro de 2011). Assim, é preciso arrumar uma maneira de quitar as dívidas e se planejar para a troca do carro com dinheiro em mãos. Isso não é nada fácil, mas com alguns “sacrifícios”, torna-se possível em um prazo razoável de tempo.
Isso posto, apresentarei duas sugestões:
1) Vender o carro atual e fazer um financiamento de outro usado de menor valor, mais econômico e com valores de seguro/IPVA menores.
Esse caso seria recomendado se o veículo atual estiver em condições precárias (exigindo muita manutenção), consumir muito combustível e apresentar um valor de seguro/IPVA alto (relativamente a outros similares).
CONSEQUÊNCIAS: diminuiria o saldo devedor e o custo médio mensal atual, além do menor impacto quanto aos efeitos da depreciação (quando comparado à compra de um carro novo).
ATITUDES COMPLEMENTARES OBRIGATÓRIAS: com o valor relativo à diminuição do custo médio mensal, recebimento de décimo terceiro (e outros extras), aliado à diminuição de outras despesas do orçamento doméstico, fazer caixa para pagamento antecipado das parcelas futuras desse novo financiamento, de forma a quitar a dívida o quanto antes. Essa alternativa exige disciplina e sacrifício no presente, para colher frutos no futuro (compra de novo carro com dinheiro em mãos).
2) Continuar com o carro atual
Se a alternativa 1 não for possível, ou seja, não existir a possibilidade de encontrar um carro usado mais barato, em bom estado, econômico e com valores de IPVA/seguro menores, o negócio é apertar os cintos e fazer de tudo para quitar o financiamento atual, da mesma forma como sugerido nas ATITUDES COMPLEMENTARES OBRIGATÓRIAS do item anterior.
CONSEQUÊNCIAS: não aumentaria o saldo devedor, não sofreria tanto as consequências com depreciação e não sairia perdendo na troca do carro.
CONCLUSÃO
Do ponto de vista puramente financeiro da questão, sem levar em consideração os sentimentos, a compra do carro novo não resolve nenhum problema. Muito pelo contrário: apenas alivia a dor momentaneamente e agrava a doença que já existe.
Para compreender melhor essa questão de como as escolhas de nosso dia a dia influenciam no bem estar financeiro, recomendo também a leitura de meu eBook “As 5 etapas do planejamento financeiro“, que ensina a visualizar através de Balanço Patrimonial e Fluxo de Caixa, o impacto dessas decisões.
Está dada a dica.
É isso aí.
A todos, boa sorte em suas finanças e vida pessoal.
PS: Quer estudar de maneira mais profunda assuntos ligados a COMPORTAMENTO FINANCEIRO? Então, não perca tempo e clique aqui agora mesmo.